O PERSONAGEM NÃO É O FILME

28/06/2012

(sobre “O Amor Nunca Acaba”)

Assista ao filme antes de ler o texto clicando aqui

 

Esse texto é uma reflexão sobre a feitura do filme O Amor Nunca Acaba e de modo algum se pretende um texto crítico ou teórico. Ele tampouco quer dar conta do filme como resultado. A ideia aqui é escrever a partir de certos pensamentos (acontecimentos) embrionários, na esperança de abrir algumas portas de entrada para esse filme que nos parece em muitos momentos opaco, fugidio e abismal.

 

Lá no começo de tudo, há mais de três anos atrás, decidimos que o nosso personagem seria um cínico e que as suas relações seriam todas mediadas por dinheiro (o mal inescapável), mas que em certo momento um trauma o levaria a rever o seu caminho até ali (“Que estranho caminho tive de percorrer para chegar até você”). A verdade é que tanto eu quanto o Ricardo acreditávamos (e acreditamos) no amor que salva: o amor pela mulher, pelos amigos, pela arte, pela vida. No caso desse filme que queríamos fazer, o vislumbre de um amor seria a descoberta de um novo mundo por parte desse homem e possivelmente sua salvação (fuga do cinismo).

 

Mas o personagem não acreditava nesse amor romântico, ele lutava contra essa ideia e se apegava às relações fugidias se mantendo impassível frente à qualquer gesto humano que abalasse as suas convicções. Por fim, os diretores (o ponto de encontro entre filme e personagem) que queriam idealizar o amor no cinema (nesse filme especificamente), acreditavam que esse amor ideal só se revelaria na imagem se ele existisse concretamente na realidade (carne da imagem), nos gestos mais cotidianos. Concluímos então, que essa imagem (a do amor ideal) só se consegue filmar quando se tem uma crença ferrenha e conjunta no amor como algo inefável, e no cinema como meio privilegiado onde conseguimos mostrar o que não se vê. Isso não aconteceu. O que aconteceu foi o embate entre o filme, o personagem e os diretores. É desse embate que nasce O Amor Nunca Acaba. O amor no filme não é palpável, logo não há redenção possível para o personagem, deixando assim, todos num beco sem saída.

 

Olhando pro filme agora entendemos mais claramente que não podemos confundir o filme com o personagem; e que nós como diretores temos que aprender a lidar com as zonas cinzas, com os abismos que existem entre personagem e filme (e em seguida filme e espectador, que é onde tudo sai do controle de vez). Podemos então atentar para certas lições do cinema americano: a luva que cai do bolso de Joaquin Phoenix no “Two lovers” de James Gray. Quem comanda esse gesto (hiper-cinematográfico diga-se de passagem)? O personagem de Phoenix, ou o filme (que inflige esse destino ao personagem)? Pergunta que cada um terá que responder por conta própria e que revela mais da pessoa que responde que do filme almejado por Gray.

 

Mas voltando ao nosso filme ainda gostaria de dizer que as coisas nem sempre são o que elas parecem. Não podemos aceitar as primeiras impressões com tanta rapidez. Tem coisa sendo dita onde menos esperamos.

 

Normalmente não fazemos filmes facilmente assimiláveis. Por isso é necessário um esforço a mais, é necessário saber que muitas vezes somos nós, como espectadores, que precisamos aprender a olhar para aquela obra, e se já tivermos aprendido, então precisamos reaprender.

 

Pra terminar queria dizer que algum dia ainda faremos filmes sobre o amor onde conseguiremos terminar como no maravilhoso It’s a wonderful life, com o James Stewart gritando “Mary Mary Mary!”. A mulher, a família, os amigos, a felicidade que não se compra. Seremos todos felizes!

 

The end.

 

(Luiz Pretti)