O BEZERRO DE OURO FOTOGÊNICO
20/09/2012
Um dos fenômenos mais curiosos da atualidade é a ausência de ambição artística em muitos dos jovens que estréiam na direção cinematográfica. Há alguns anos, os primeiros filmes de um realizador indicavam um desejo evidente de se esquivar aos caminhos já batidos. Esse estado de espírito gerou o que na época se chamava de avant-garde, cujo produto mais característico foi sem dúvida Entr’acte, de René Clair.
Leio esse texto e tenho uma forte sensação de que ele poderia ter sido escrito hoje, o que me deixa triste. Ao mesmo tempo, por outro lado, fico feliz, pois sinto minhas utopias recarregadas.
O que eu quero não é o que eu vou conseguir, mas é o que me move. E o importante é querer, continuar querendo e seguir em movimento. Porque mover-se já é uma coisa maravilhosa. Contagiar e contagiar-se pelo movimento – o movimento pelo movimento -, enfrentar a ordem, bater de frente com as vozes que exigem resultado, resultado e resultado. O utilitarismo é uma merda. A comodidade é uma merda. Escolher fazer cinema foi pra mim uma escolha radical, permanecer fazendo cinema não pode deixar de ser isso. Já cansei de escutar que pra se ganhar dinheiro é preciso sujar as mãos. E mesmo que a história do cinema brasileiro careça de exemplos contrários, prefiro continuar acreditando que é possível seguir fazendo filmes com as mãos limpas e viver disso. Fazer o filme que se quer fazer, porque existe uma necessidade vital de faze-lo, uma necessidade de movimento, de descoberta, de conexão com o outro (seja esse outro quem for). No Brasil não existe indústria. Se existisse talvez fosse possível que essa indústria um dia amadurecesse ao ponto de comportar também expressões artísticas e não jogadas meramente mercantis. Mesmo desconfiando de tal hipótese, nesse caso, a questão seria outra: como manter as mãos limpas dentro de um sistema industrial. Entenda-se por mãos limpas “não filmar coisa alguma que não saia diretamente do coração.”
(Guto Parente)