Aquele cara – Dellani + Jonnata

11/03/2015

A beleza desse filme único, dirigido por Dellani Lima, se impõe como uma evidência de rigor e de clareza poética. Em algum momento do curso que ministrou ao longo do Festival de Curtas de BH, citando Epstein, Nicole Brenez falava da necessidade de uma “poesia mais rigorosa” contra a afasia do cinema dominante. Pois esse desejo acharia sua contraparte prática, sua realização imediata, nesse encontro – pois na verdade é disso que se trata, de um encontro – entre Jonnata Doll e Dellani Lima. Os filmes desse último sempre oscilaram entre o entusiasmo e a serenidade, entre picos de desespero criativo – o afeto, o barroquismo, a eloquência – e um certo decadentismo romântico – a fossa, a frustração. Mas existe também uma faixa, uma frequência intemediária, de concentração de energia, e de preferência pelas formas e pelas soluções simples. É o caso de Aquele Cara, que usa a mesma estratégia de Calça de Veludo, mas na verdade traz à memória um outro filme, de título punk e cores lunares, o distante Quando morri na Bahia de Guanabara. Tendo escolhido não dizer nada nesse filme de oito anos atrás, Dellani, não muito longe de um auto-retrato, encontra em Aquele Cara a melhor pessoa para dizer aquilo que ele jamais saberia ou poderia dizer sobre si mesmo. A isso vem se somar a intimidade do enquadramento, e o tratamento sublime, quase erótico, do som e da imagem. Quanto a Jonnata é difícil dizer qualquer coisa sobre ele e não parecer leviano. Não é apenas a lucidez daquilo que ele diz, e a beleza daquilo que canta, que é desconcertante – e que nos faz sentir a todos um pouco mais vivos, um pouco menos banais. É desconcertante também a verdade e a felicidade daquela conjunção de coisas – o rosto cinematográfico, pasoliniano, o mar, as pedras, e a presença flutuante de uma mulher – tudo admiravelmente simples e necessário.

João Dumans