Djalioh, por Leonardo Amaral

24/12/2012

Djalioh é um filme-ensaio. Não na definição tradicional que o termo recebeu em seus estudos acadêmicos, mas bem mais um ensaio sobre a psicologia humana. Um ensaio sobre contar uma história, sobre o narrador em cena. Não é por menos que o filme de Ricardo Miranda parte de um conto de Flaubert, Estudos Psicológicos, e tem como grande matriz Straub e Huillet. No entanto, há algumas diferenciações entre a obra de Miranda e os filmes realizado pelo casal de cineastas, principalmente no que tange a construção da encenação a partir dos atores. Além disso, Djalioh é um filme sobre a duplicidade: seja do ser, seja dos corpos em cena. A decupagem esquadrinhada apresenta sempre o duplo em cena: os dois pés que caminham pela mata e escada, as duas partes da personagem Adèle (seus fragmentos de razão e emoção) ou a dupla representação de Djalioh (Octávio Terceiro é ao mesmo tempo o homem Djaloh e o primo Paul, aquele responsável por pressionar Adèle).

Estudos Psicológicos é um relato sobre a vinda de um narrador-escritor pelos trópicos e sua experiência zoomórfica em terras quentes. O homem se espelha no macaco, e dessa interação, ele se permite a expressão de seus instintos mais primitivos. Na visita ao zoológico, o contraplano do olhar dos visitantes alcança o do primata, que corresponde aos sorrisos e emoções. Djalioh, o personagem, surge dessa interação, da escrava atacada por um orangotango. Da relação, surge o vômito, e da narrativa de Flaubert, aparece a relação primeira do homem e do macaco. A expressão desses instintos aparece nos momentos de reflexão da personagem em cisão, vivida pelas atrizes Mariana Fausto e Bárbara Vida, da destruição de um violino por Octávio Terceiro, ou da dor da escrava que dá origem ao homem-macaco. Nesse sentido, Djalioh torna-se também uma experiência cientifica e também sobre os relatos desse experimento. Helena Ignez, ao descer as ladeiras de Petrópolis com uma taça de vinho entre as mãos, é aquela que inicia o percurso literário e imagético da carta do visitante francês no Brasil. A primeira das imagens, de uma trilha que nos guia, são acompanhadas pela carta-convite a essa viagem experimental. A paisagem, aliás, é algo fundamental na construção imagética proposta por Ricardo Miranda. São vários os enquadramentos em que a paisagem invade a cena, como no quadro que apresenta ‘Adèle emoção’, na cozinha, passando café enquanto é possível ver, refletida na janela, as árvores e plantas da mata.

Ao final, o científico procura a explicação do inexplicável. O corpo da parte da emoção de Adèle não resiste e jaz morta no chão, ao lado de Djalioh, que também não resiste e acaba inerte envolto em sangue pelo chão. Ambos são acompanhados pela parte da razão de Adèle e por um legista vivido por Tonico Pereira, que gira em torno da cena, toca os corpos, se ajoelha no sangue em busca de um exame que jamais alcança uma tese explicativa. Resta ao mesmo sentar-se ao lado e acender um cigarro e apenas observar. Por fim, Djalioh se constitui como um ensaio sobre a observação e da externação da psicologia e bestialidade humana em suas diversas figurações.

 

LeonardoAmaral:
http://www.filmespolvo.com.br/site/eventos/cobertura/1289

 

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